
As principais formas de tratados do AOM eram: (1) de paridade, envolvendo pessoas do mesmo nível social; (2) concessão real, em que o rei concede a seu súdito alguns benefícios mediante serviços fiéis que o agradaram; e (3) suserano-vassalo, em que o rei que tinha total soberania exigia plena submissão e lealdade do vassalo, que em troca recebia proteção e ajuda militar. O tratado envolvendo Ramsés II e Hatusillis III encaixa-se nessa terceira categoria.
A estrutura dos tratados hititas e o Pentateuco
Os tratados imperiais hititas do 14º e 13º séculos a.C. apresentam uma estrutura elaborada em seis seções: título ou preâmbulo, prólogo histórico, estipulações, o depósito do tratado, a invocação das testemunhas, as maldições e as bênçãos.
George Mendenhall, importante erudito do Antigo Testamento no século passado, foi o primeiro a perceber a semelhança entre a estrutura dos tratados hititas e as alianças de Deus e Israel em Êxodo 20-31; 34-35 e Levítico 11-25. Neste caso, a evidência externa sugere que a melhor data para a composição do Pentateuco é por volta da metade do 2º milênio a.C. (Ca. 1400 a.C.).
A seguir, cada uma das partes desta estrutura será mostrada juntamente com o seu correspondente bíblico:
1) Título ou preâmbulo. Identifica o autor (suserano) do tratado. Em Êxodo 20:1, lemos: “Deus falou todas estas palavras...”
2) Prólogo histórico. O suserano declara os seus benefícios em favor do vassalo, demonstrando assim sua misericórdia e poder. Em Êxodo 20:2, Deus Se identifica como “o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”.
3) Estipulações. Esta parte envolve a declaração dos deveres impostos sobre o vassalo como aquele que deve total lealdade ao suserano. A continuação do texto de Êxodo 20, os versos 3-17, apresenta os dez mandamentos como estipulações, e os capítulos seguintes (21-23 e 25-31) registram outras regulamentações mais detalhadas para reger a vida social. Além destas, há também instruções quanto a provisão para a casa (tabernáculo) do Suserano (Êx 35).
4) Depósito do tratado. O documento deveria ser bem guardado para ser lido novamente em outras ocasiões. A “Arca da Aliança” era assim chamada por conter em seu interior as estipulações de Deus para Seu povo (Êx 25:16).
5) Testemunhas. Os deuses das nações envolvidas eram invocados como testemunhas daquilo que havia sido dito. Há também o caso de elementos da natureza como pedras, vento, sol, lua e estrelas que eram tidos como testemunhas em algumas ocasiões. O correspondente bíblico desta porção parece ser Êxodo 24:4-8, onde Moisés levanta um altar com 12 pedras, representando as 12 tribos de Israel, para cumprir o papel de testemunhas mudas.
6) Bênçãos e maldições. Isto é, aquilo que o suserano faria caso seu vassalo fosse fiel ou não. Em Levítico 26, temos referências a bênçãos (pela obediência) e maldições (pela desobediência).
A evidência dessa estrutura em outras partes do Pentateuco
Essa mesma estrutura pode ser encontrada em outros lugares do Antigo Testamento. Em Deuteronômio 1:1-5, por exemplo, temos o título ou preâmbulo, e o prólogo histórico em 1:6-3:29. Logo após, então, temos as estipulações: (1) os dez mandamentos (5:7:21); (2) outras ordenanças mais extensas (6-11); e (3) regulamentações mais específicas (12-26). O documento da aliança sendo depositado no Santuário (31:9-13). Os céus e a terra sendo chamados de testemunhas (31:28) e, finalmente, as bênçãos (28:1-14) e as maldições (28:15-68) encerrando o livro.
Avaliação da evidência
A composição do Pentateuco é situada por alguns como tendo ocorrido no período do cativeiro babilônico (Ca. 600 a.C.), ou no período persa (Ca. 500 a.C.), ou até no período grego (Ca. 300 a.C.). O problema com esse tipo de argumentação é que a estrutura das alianças da metade do 1º milênio a.C. sofreu drásticas modificações. No período assírio (Ca. 700 a.C.), por exemplo, o tratado suserano-vassalo era composto de quatro partes na seguinte ordem: preâmbulo, testemunhas, estipulações e maldições.
Uma vez que as alianças do Pentateuco possuem a mesma estrutura dos textos hititas do 14º e 13º século a.C., parece mais razoável aceitarmos que a data da composição do texto bíblico seja a mesma de tais tratados e não depois, como os críticos afirmam.
Luiz Gustavo Assis é formado em Teologia e atua como Capelão no Colégio Adventista de Esteio, RS.
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