sábado, janeiro 17, 2009

A historicidade confiável do livro de Daniel

Há pelo menos três bons motivos para acreditarmos que o livro de Daniel é confiável do ponto de vista histórico e que de fato foi escrito no 6º século antes de Cristo:

1) A arqueologia tem reconstruído as informações históricas do livro de Daniel.

a) Toda a história desse profeta hebreu se passa na cidade de Babilônia. Os críticos da Bíblia afirmavam que se Babilônia realmente houvesse existido, não passaria de um pequeno clã. A arqueologia demonstrou o oposto. Os resultados dos estudos do arqueólogo alemão Robert Koldewey, feitos entre 1899 e 1917, provaram que Babilônia era um grande centro econômico e político no Antigo Oriente Médio na metade do 1º milênio a.C. (600 a.C.).

b) Outro ponto de questionamento era sobre a existência ou não de Nabucodonosor, rei de Babilônia na época do profeta Daniel. Mais uma vez a arqueologia resolveu a questão trazendo à luz muitos tabletes que foram encontrados nas ruínas escavadas por Koldewey com o nome Nabu-Kudurru-Usur, ou seja, Nabucodonosor! Não é incrível como um tablete de 2.600 anos consegue esmiuçar teorias fundamentadas no silêncio?

c) Assim como a opinião dos críticos teve que ser radicalmente mudada a respeito de Babilônia e de Nabucodonosor, o mesmo aconteceu com Belsazar, o último rei da Babilônia. Críticos modernos não concordavam com essa informação. Novamente a arqueologia refutou essa opinião. Vários tabletes cuneiformes confirmam que Nabonido, o último rei de Babilônia, deixou seu filho Bel-Shar-Usur (Belsazar) cuidando do Império enquanto ele estava em Temã, na Arábia. Você pode confirmar em Daniel 5:7 que Belsazar ofereceu para Daniel o terceiro lugar no reino, já que o pai, Nabonido, era o primeiro e ele, Belsazar, o segundo.

d) Até os amigos de Daniel estão documentados nos tabletes cuneiformes da antiga Babilônia. Foi descoberto um prisma de argila, publicado em 1931, contendo o nome dos oficiais de Nabucodonosor. Três nomes nos interessam: Hanunu (Hananias), Ardi-Nabu (Abed Nego) e Mushallim-Marduk (Mesaque). Incrível! Os mesmos nomes dos companheiros de Daniel mencionados nos capítulos 1, 2 e 3 de seu livro! Um grande defensor dessa associação é o adventista e especialista em estudos orientais William Shea, em seu artigo: “Daniel 3: Extra-biblical texts and the convocation on the plain of Dura”, AUSS 20:1 [Spring, 1982] 29-52. Hoje esse artefato encontra-se no Museu de Istambul, na Turquia.

Resumindo: as informações históricas do livro de Daniel são confirmadas pela arqueologia bíblica.

2) Por muitos anos os defensores da composição do livro de Daniel no 2º século a.C. se valeram das palavras gregas do capítulo 3 para “confirmar” a autoria da obra no período helenístico. Essa opinião apresenta dois problemas sérios:

a) Há ampla documentação do relacionamento entre os gregos e os impérios da Mesopotâmia antes mesmo do 6º século a.C. Nos registros do rei assírio Sargão II, por exemplo, fala-se sobre cativos da região da Macedônia (Cicília, Lídia, Ionia e Chipre). Se os judeus em Babilônia eram solicitados para tocar canções judaicas (Salmo 137:3), por que não imaginar o mesmo com os gregos? Um poeta grego chamado Alcaeus de Lesbos (600 a.C.) menciona que seu irmão Antimenidas estava servindo no exército de Babilônia. Logo, não nos deve causar espanto algum o fato de termos na orquestra babilônica instrumentos gregos.

b) Se o livro de Daniel foi escrito durante o período de dominação grega sobre os judeus, por que há apenas três palavras gregas ao longo de todo o livro? Por que não há costumes helenísticos em nenhum dos incidentes do livro numa época em que os judeus eram fortemente influenciados pelos filósofos da Grécia? Esse fato parece negar uma data no 2º século a.C.

Resumindo: o fato de existirem palavras gregas no terceiro capítulo de Daniel não prova sua composição no 2º século a.C., pelo contrário, intercâmbio cultural entre Babilônia e Grécia era comum antes mesmo do 6º século a.C.

3) Daniel foi escrito em dois idiomas: hebraico (1:1-2:4 e 8:1-12:13) e aramaico (2:4b-7:28).

Diversos nomes no estudo do aramaico bíblico (Kenneth Kitchen, Gleason Archer Jr, Franz Rosenthal, por exemplo) afirmam que o aramaico usado por Daniel difere em muito do aramaico utilizado nos Manuscritos do Mar Morto que datam do 2º século a.C. Para Archer Jr., a morfologia, o vocabulário e a sintaxe do aramaico do livro de Daniel são bem mais antigos do que os textos encontrados no deserto da Judéia. Não só isso, mas que o tipo da língua que Daniel utilizou para escrever era o mesmo utilizado nas “cortes” por volta do 7º século a.C.

Resumindo: o aramaico utilizado por Daniel corresponde justamente àquele utilizado em meados no 6º século a.C. nas cortes reais.

Qual a relevância dessas informações para um leitor da Bíblia no século 21? Gostaria de destacar dois pontos para responder esta questão:

1) Como foi demonstrado acima, Daniel escreveu seu livro muito antes do cumprimento de suas profecias. Logo, isso nos mostra a Soberania e Autoridade de Deus sobre a história da civilização. Se Deus é capaz de comandar o futuro, Ele é a única resposta para os problemas da humanidade.

2) A inspiração das Escrituras. O livro de Daniel se mostrou confiável no ponto de vista histórico e, consequentemente, profético. Essa é a realidade com toda a Bíblia, que graças a descobertas de cidades, personagens e inscrições, mostra-se verdadeira para o ser humano.

O livro de Daniel, longe de ser uma fraude, é um relato fidedigno. Ao escavarmos profundamente as Escrituras e estudarmos a História, podemos perceber que a Bíblia é um documento histórico confiável.

Luiz Gustavo Assis é formado em Teologia e atua como Capelão no Colégio Adventista de Esteio, RS.

O endereço do Mestre

Para muitas pessoas, a narrativa evangélica da vida de Jesus não passa de ficção. Contudo, uma rápida pesquisa sobre os achados arqueológicos relacionados com o Novo Testamento revelará o contrário: cremos em uma história real! A partir de agora, vamos examinar algumas informações bíblicas à luz das descobertas em Cafarnaum, o “endereço” do Mestre.

O nome Cafarnaum pode significar tanto “vila da consolação” como “vila de Naum”, um antigo profeta hebreu cujo livro faz parte do Antigo Testamento. Essa última opção é apoiada por uma tradição judaica que afirma que o túmulo do profeta está enterrado ali. A cidade foi descoberta por um arqueólogo norte-americano chamado Edward Robinson, em 1852, mas somente foi escavada por uma equipe liderada por Charles Wilson em 1865 e 1866. Foi ali que Jesus dedicou a maior parte do Seu ministério, realizando milagres (Mt 9:18-26; Mc 5:21-43; Lc 8:40-56), bem como ensinando na sinagoga local (Mc 1:21; 3:1-5; Lc 4:31; Jo 6:59).

Um dos achados mais fascinantes de Cafarnaum é a da possível casa de Pedro. Foi por volta de 1968 que dois outros arqueólogos, G. Orfali e A. Gassi, encontraram a estrutura de uma igreja que datava do 5º século. O surpreendente foi que logo abaixo dessa construção eles também encontraram os alicerces de uma casa repleta de objetos de pesca que datava da época de Jesus e Seus discípulos. Para completar a informação, um documento chamado Itinerarium, escrito por Egéria, no 4º século, afirma que a “casa do príncipe dos apóstolos foi transformada em igreja; contudo, as paredes da casa ainda estão de pé como eram originalmente”.

Outra descoberta marcante em Cafanaum foram os restos da sinagoga, local de reuniões religiosas dos judeus, do 1º século. Durante os anos de 1905 até 1926, seus restos foram preservados e restaurados por especialistas alemães e franciscanos. Até então, todas as construções apontavam para uma construção do 3º ou 4º século. No entanto, em 1968, as pesquisas posteriores revelaram os restos de uma estrutura. E em 1981, um largo piso de basalto foi encontrado repleto de cerâmicas (potes, vasos, copos, etc.) do 1º século, a época de Cristo. Sem dúvida, esses eram os escombros daquela sinagoga frequentada por Jesus, como mencionado nas Escrituras Sagradas!

Mais importante do que as informações arqueológicas é o que tudo isso representa. Foi nessa mesma sinagoga que Jesus declarou: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém dele comer, viverá eternamente” (João 6:51). Mesmo com a poeira acumulada ao longo dos séculos em Cafarnaum, ainda somos capazes de ouvir o convite do Mestre querendo saciar nossa fome.

(Luiz Gustavo Assis é formado em Teologia e atua como Capelão no Colégio Adventista de Esteio, RS)

Desenterrando um império (parte 3)

No artigo anterior, descrevemos como ocorreu uma importante descoberta na antiga Hattusas, a capital dos hititas. Antigos tratados (alianças) entre reis de importantes povos no Antigo Oriente Médio (AOM) são importantes na compreensão do ambiente político dessa região.

As principais formas de tratados do AOM eram: (1) de paridade, envolvendo pessoas do mesmo nível social; (2) concessão real, em que o rei concede a seu súdito alguns benefícios mediante serviços fiéis que o agradaram; e (3) suserano-vassalo, em que o rei que tinha total soberania exigia plena submissão e lealdade do vassalo, que em troca recebia proteção e ajuda militar. O tratado envolvendo Ramsés II e Hatusillis III encaixa-se nessa terceira categoria.

A estrutura dos tratados hititas e o Pentateuco

Os tratados imperiais hititas do 14º e 13º séculos a.C. apresentam uma estrutura elaborada em seis seções: título ou preâmbulo, prólogo histórico, estipulações, o depósito do tratado, a invocação das testemunhas, as maldições e as bênçãos.

George Mendenhall, importante erudito do Antigo Testamento no século passado, foi o primeiro a perceber a semelhança entre a estrutura dos tratados hititas e as alianças de Deus e Israel em Êxodo 20-31; 34-35 e Levítico 11-25. Neste caso, a evidência externa sugere que a melhor data para a composição do Pentateuco é por volta da metade do 2º milênio a.C. (Ca. 1400 a.C.).

A seguir, cada uma das partes desta estrutura será mostrada juntamente com o seu correspondente bíblico:

1) Título ou preâmbulo. Identifica o autor (suserano) do tratado. Em Êxodo 20:1, lemos: “Deus falou todas estas palavras...”

2) Prólogo histórico. O suserano declara os seus benefícios em favor do vassalo, demonstrando assim sua misericórdia e poder. Em Êxodo 20:2, Deus Se identifica como “o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”.

3) Estipulações. Esta parte envolve a declaração dos deveres impostos sobre o vassalo como aquele que deve total lealdade ao suserano. A continuação do texto de Êxodo 20, os versos 3-17, apresenta os dez mandamentos como estipulações, e os capítulos seguintes (21-23 e 25-31) registram outras regulamentações mais detalhadas para reger a vida social. Além destas, há também instruções quanto a provisão para a casa (tabernáculo) do Suserano (Êx 35).

4) Depósito do tratado. O documento deveria ser bem guardado para ser lido novamente em outras ocasiões. A “Arca da Aliança” era assim chamada por conter em seu interior as estipulações de Deus para Seu povo (Êx 25:16).

5) Testemunhas. Os deuses das nações envolvidas eram invocados como testemunhas daquilo que havia sido dito. Há também o caso de elementos da natureza como pedras, vento, sol, lua e estrelas que eram tidos como testemunhas em algumas ocasiões. O correspondente bíblico desta porção parece ser Êxodo 24:4-8, onde Moisés levanta um altar com 12 pedras, representando as 12 tribos de Israel, para cumprir o papel de testemunhas mudas.

6) Bênçãos e maldições. Isto é, aquilo que o suserano faria caso seu vassalo fosse fiel ou não. Em Levítico 26, temos referências a bênçãos (pela obediência) e maldições (pela desobediência).

A evidência dessa estrutura em outras partes do Pentateuco

Essa mesma estrutura pode ser encontrada em outros lugares do Antigo Testamento. Em Deuteronômio 1:1-5, por exemplo, temos o título ou preâmbulo, e o prólogo histórico em 1:6-3:29. Logo após, então, temos as estipulações: (1) os dez mandamentos (5:7:21); (2) outras ordenanças mais extensas (6-11); e (3) regulamentações mais específicas (12-26). O documento da aliança sendo depositado no Santuário (31:9-13). Os céus e a terra sendo chamados de testemunhas (31:28) e, finalmente, as bênçãos (28:1-14) e as maldições (28:15-68) encerrando o livro.

Avaliação da evidência

A composição do Pentateuco é situada por alguns como tendo ocorrido no período do cativeiro babilônico (Ca. 600 a.C.), ou no período persa (Ca. 500 a.C.), ou até no período grego (Ca. 300 a.C.). O problema com esse tipo de argumentação é que a estrutura das alianças da metade do 1º milênio a.C. sofreu drásticas modificações. No período assírio (Ca. 700 a.C.), por exemplo, o tratado suserano-vassalo era composto de quatro partes na seguinte ordem: preâmbulo, testemunhas, estipulações e maldições.

Uma vez que as alianças do Pentateuco possuem a mesma estrutura dos textos hititas do 14º e 13º século a.C., parece mais razoável aceitarmos que a data da composição do texto bíblico seja a mesma de tais tratados e não depois, como os críticos afirmam.

Luiz Gustavo Assis é formado em Teologia e atua como Capelão no Colégio Adventista de Esteio, RS.

Leia também: “Desenterrando um império” (parte 1)

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